sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

O SET UP INICIAL NO AGACHAMENTO, DO POWERLIFTING AO CROSSFIT, É O OPOSTO DE TUDO QUE VOCÊ JÁ OUVIU... Denilson Costa


“Set up” é o termo em inglês que designa a posição corporal preparatória pro início dos 3 powerlifts. No caso do supino, o mais popular dos movimentos, isso já está mais ou menos estabelecido pelo senso comum: “aduzir e deprimir as escápulas para formar uma base sólida antes de empurrar a barra”, existem, no entanto, outras discussões cabíveis como, arquear ou não a coluna; abertura das mãos na barra; empurrar em linha reta ou em direção à cabeça, etc.

No agachamento fica tudo menos claro, ele é um espaço onde a individualidade biológica dos levantadores tem originado discrepâncias de set ups e de execuções muito mais notáveis. O que eu disser por tanto daqui pra frente, é apenas a minha opinião, mas o peso dessa opinião são uns quase 30 anos de agachamentos, além de algumas lesões sérias de joelho e quadril, não causadas diretamente pelo esporte, mas que, sem dúvida, afetam a mecânica do movimento.

Powerlifting é o único esporte onde chegamos mais perto de testar FORÇA MÁXIMA de fato. Sim, eu disse o único! A razão é simples: A força só atinge seu máximo valor em condições isométricas, coisa constantemente verificada em laboratórios que mensuram EMG. Aquele lindo arremesso com 3 luzes brancas, em que a barra sobe dos ombros como que recebendo um potente soco do levantador, que ao mesmo tempo afunda explosivamente sob a mesma, está muito mais distante da força máxima do que aquele supino que sobe quase parando; e que eventualmente para no meio do caminho. Na verdade, tecnicamente, o powerlifter só produz força máxima quando a barra para no meio do trajeto! Por isso, Mel Siff em seu livro Super Training com Verkhoshansky, prefere o termo: força máxima dinâmica!

Mas por que essa introdução? Um powerlifter necessita de toda energia possível para produzir uma esforço máximo, e algumas estratégias propostas de setup começam a consumir energia desnecessária ja antes mesmo do início dos levantamentos:



PUXAR A BARRA PARA BAIXO COM OS DORSAIS:

O trapézio obviamente é um músculo, assim como o deltoide posterior. Ambos possuem superfícies íngremes na postura ereta. Puxar a barra pra baixo só vai aumentar a necessidade de magnésio sobre as costas, e a barra tenderá a escorregar como um carro sem freio na ladeira. No caso de mulheres ou levantadores muito leves, com menos massa muscular nos ombros e trapézio, essa orientação é impraticável. Além do mais, o levantador durante um agachamento deve reunir forças para colocar a barra pra cima, e não há sentido por tanto em fazer outra força de tração em direção oposta!

Anatomia da posição da barra sobre o trapézio... Será que é mesmo uma boa idéia puxar 260 kg para baixo durante o agachamento ?



MANTER COTOVELOS SOB A BARRA:

O único momento em que os cotovelos podem ser aproximar de uma linha vertical com a barra é durante a fase de subida de um agachamento onde ocorre projeção do tronco à frente. De resto, são validas as mesmas considerações acima. Fazendo o oposto na verdade; ou seja, apontando os cotovelos mais diagonalmente antes de agachar, o levantador deixará os músculos de apoio (deltoide e trapézio) menos íngremes, e formara uma base maior e menos escorregadia para barra, consumindo por tanto menos energia para sustentá-la



ADUZIR AS ESCAPULAS:

Apesar de sua unanimidade no supino, no agachamento erguemos cargas muito mais elevadas, e ao contrário do primeiro, temos que equilibrar uma barra de 220 cm apoiada numa área de 1/8 do seu comprimento. O levantador obviamente necessita de algum grau de rigidez na estrutura não só da cintura escapular como de todo o tronco, mas espremer ombros e escapulas ao máximo um lado contra o outro, tornará essa base de apoio ainda mais estreita, diminuindo a estabilidade lateral principalmente.



EXPANDIR O TÓRAX E LEVANTAR O PEITO:



Essa é uma orientação que “parece” plausível, sobretudo pelo fato

 de muitos levantadores ja inclinarem o tronco bastante à frente 

num power squat. A intenção é manter as curvas fisiológicas 

preservando a integridade dos discos. Ocorre, no entanto, que ao

 expandir o tórax para manter a lombar arqueada, toda coluna passa

 a ficar arqueada, e a cifose torácica é invertida. O levantador vai 

projetar mais massa corporal à frente da barra, causando uma “pre-

exaustão” antecipada dos eretores da coluna. Também é possível no

caso de um power squat típico, um aumento ainda maior da 

inclinação anterior do tronco. O atleta devera analisar em vídeo e

 com seu treinador, se esse tipo de manobra de fato aumenta a 

quilagem do seu agachamento ou cria novos sticking points.



Butt wink,,,   Se eles podem, até voce pode ! Na sequencia 3 pedidas, observem como a postura se modifica com cada incremento de peso. Imaginem num terra ou agachamento máximo !


ARQUEAR A LOMBAR x BUTT WINK:



Manter as curvas fisiológicas diminui a pressão interdiscal na postura ortostática, de pé; é o que nos diz Kapanji em seu texto Fisiologia Articular, mas será que a postura fisiológica é exatamente a mesma de pé, agachado ou inclinado? Não existiria um meio termo natural e confortável, entre o “arqueado” e uma exagerada hiperflexão de tronco (cifose total)? A ascensão do crossfit fez surgir uma legião de especialistas em agachamento, que se tornaram obcecados pelo tal “butt wink”; tendência de apagamento da curva lombar na posição mais funda dos agachamentos. O fato é que alguns dos maiores agachadores de todos os tempos como Ed Coan e Fred Hatfield (Dr Squat), agachavam exatamente desta forma! Variações anatômicas no quadril tambem podem dificultar muito a lordose no fundo do agachamento...

                                               Ed Coan "butt winking" mais de 400 kg...

Na esquerda, retroversão da pelve compatível com a posição, na direita, total perda do controle muscular

CONCLUSÃO: Muito se fala em “postura neutra”, mas não parece haver consenso no que a mesma seria. Na minha opinião, postura neutra é aquela que exige menor consumo de energia antes do início dos levantamentos, e permite manter a barra em sua posição com menor esforço! É assim que Koklyaev e Wu, o treinador chinês, conseguem agachar pesado sem as mãos! Minha sugestão é que não tentem ajudar a gravidade puxando a barra para baixo já que o objetivo do agachamento é vencer a mesma !

Bons treinos, prof. Denilson Costa



Um comentário:

  1. Denilson, ótimo texto, gostei demais, apesar de ter demorado a vir ler - deixei na fila mais do que queria.

    Penso que puxar a barra para baixo só ajuda na ativação compensatória dos dorsais, para auxiliarem na neutralização de curvaturas torácicas e lombares, se feito na medida certa. Sabendo ativar os dorsais isometricamente sem essa puxada, pra mim, dá no mesmo.

    Acho que a dica dos cotovelos se propõe a evitar o que muitos iniciantes fazem de erguer os mesmos desde o alto do movimento, o que termina acentuando flexão da coluna. Novamente, acho que é um "coaching cue" de iniciante, talvez levado a consequências não desejadas.

    Não saberia dizer a variação média de superfície de contato com a barra quando as escápulas estão aduzidas contra quando não estão. Novamente, vejo uma dica para extensão torácica.

    Sobre erguer o peito, concordo 100%: vídeos ajudam demais a decidir o que é bom e o que é demais.

    O Butt Wink é mesmo uma polêmica. Eu costumo explorar a posição de agachamento mais natural que retarde esse fenômeno para depois da paralela, porque numa base anatômica de pés não faz sentido retroverter o quadril acima da paralela - pelo menos, acho que não. Testo a flexão do quadril na posição quadrúpede e em supinação, pra depois avaliar ser há justificativa. A questão é que o "cue" de quem não agacha bem nem sem peso algum nos ombros não pode ser o mesmo de quem está com mais de 2 vezes o próprio peso nas costas, correto?

    Muito legal a leitura, parabéns!

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